9 de março de 2012

Pensando Rodarte numa varanda de vó

Esse review é um dos meus muitos devaneios tidos ao ver a coleção mais recente da Rodarte. Devo avisar que um pouco da linearidade foi deixada no caminho, assim sem compromisso nenhum, nem motivo aparente. Deixo pra quem lê a tarefa de preencher lacunas.


Lembro-me de minha vó uma vez dizer algo assim quando perguntei qual era o motivo da sua grande quantidade de  grampos no guarda-roupa:

 O grampo prende o cabelo indisciplinado, não é como se ele fosse um vilão nem o mocinho: até cabelos, vez ou outra, precisam de disciplina. Vez ou outra.

A frase__ livremente modificada para seu maior deleite poético (rs)__ pode não ter saído exatamente assim quando dita por minha vó, mas foi dessa maneira que a entendi__ o que, sejamos sinceros, é o que mais importa.






Quanto à coleção mais recente das irmãs Mulleavy, mais do que manter um possível "DNA Rodarte", elas conseguiram imergir suas criações num contexto mais sisudo e formal, conseguindo uma coleção de apelo comercial sem perder a força que lhes deu legitimidade há 4 anos atrás quando foram vencedoras do CFDA.Pouco tempo para uma evolução tão significativa? Talvez, mas o tempo não é o mesmo para todos.









Tanto que a coleção não se mostra facilmente, como algo cheio de pompa e ostentação. O mérito residiu nos detalhes engenhosamente pensados na maioria das peças, sejam as golas removíveis, camadas intercaladas quase imperceptivelmente, "jóias" aplicadas sem uma organização muito específica, o cabelo levemente desajeitado, os broches. Mesmo o espectro de 'vó' erradamente associado a algumas criações já feitas parece ir por água abaixo quando, num vestido de couro, a cintura marcada divide lugar com estampas que poderiam ter saído do meu antigo Atari
Contudo, se o cenário não foi trabalhado(como por exemplo em 2009) foi justamente porque, a essa altura do campeonato, não se fazia mais tão necessário. Seria pleonasmo imagético(um beijo para quem inventa neologismos mil), e mesmo desperdício, martelar na cabeça do espectador um conceito que conseguiu chegar e cativar de maneira tão sutil, quase que sem perceber. Méritos também à setlist com The Chills, Suicide e Ramones que pode ser baixada aqui

Se a coleção é um cristal ou jóia legítima, de nobre extração e habilidoso refinamento não é esta a questão. O cristal pode não ser legítimo nem raro, e talvez, nem cristal. Talvez seja uma imitação em acrílico, que nada de refinado tem e que, por isso mesmo, convida para uma intervenção, para um pensamento que vai além do que nos é apresentado.

Mais do que fortaleza da solidão,  a coleção é uma nostalgia convidativa, que pulsa mesmo em quem não reconhece o motivo da mesma. Um passado que não prende nem oprime mas que no aconchego permite embalos e viagens à bel-prazer para fabularmos nossas construções próprias.


E a força está aí, na construção não terminada. Na presilha que prende sem prender, que acomoda mas não limita.

Fotos [via Vogue UK & Scott Decker ]

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